sexta-feira, 16 de maio de 2008

dorme mais um pouco...





há corações-plataforma feitos de raízes líquidas. há mãos na areia a desenhar o futuro e corpos estendidos a ouvir o rumor longínquo dos cometas. às vezes, o mar entra pela casa num azul tingido de amor. as gaivotas pousam nos dedos e deixam cair as suas asas. e tudo roda, ao ritmo cósmico da verdade dos sonhos. dentro dos livros, viro páginas feitas de mundos, palavras imensas que prometem a palavra para sempre. há qualquer coisa de eterno nos corações sem medo. e, depois, uma espécie profunda de paz.

- há quanto tempo nos conhecemos?
- desde o princípio do mundo.
- só?
- sim.
- ainda me lembro onde te encontrei.
- na rua, a contar as lágrimas que guardava com a mão.
- eram tantas.
- um oceano.
- ainda choras?
- construíste-me uma barragem.
- juras?
- para quê?
- para eu acreditar.
-em quê?
- no amor.
- nós somos o amor.
- que horas são?
- onde?
- onde quiseres.
- é meia-noite em algum sítio do mundo.
- é tarde?
- contigo não.

e vagueio por entre ruas que se abrem no instante do meu caminho. há nuvens pousadas no chão. corpos que dançam dentro da noite. gargalhadas nocturnas. e eu sigo cantando uma canção que nunca ouvi. porque só o mistério elíptico do mundo se escuta nas entranhas da noite. e as casas voam em direcção ao céu. e são altas. deixam cair no mundo os seus quartos iluminados. o amor lírico que guardavam docemente. os anos inventados lá dentro. vejo flores a nascer contra o cimento. e deixo-as crescer dentro dos meus olhos. passeiam livros no vento das ruas. e soltam palavras que brilham ao fundo das horas. e o meu coração roda centrípeto dentro de mim. a entropia feita de escuro. e a vida a amanhecer.
e se eu pudesse, abria todas as janelas fechadas. todas as portas trancadas. arrancava-lhes as fechaduras.
e deixava o mundo entrar.às vezes, quero ser o mundo inteiro. e ter pássaros a dormir nas minhas mãos. levantar o corpo nascido árvore. estarrecer o chão. abrir braços sísmicos. com frutos pendentes. quase-pérolas. flores por acontecer. e, às vezes, fecho os olhos às vertigens dos meus sonhos. enrosco-me na realidade. às vezes, há um vórtice de paz. e procuro no mundo a loucura profunda de ser simples. o assombro dos dias claros. do lado avesso do mundo, o coração descompassado. e, às vezes, só às vezes, quero ser tudo de novo. para então adormecer.
atravessar a rua. ou o outro lado da noite. casas-labirinto dentro de nós. coração feito lanterna. multidões de vidas a acontecer. abraços de quem nos quer bem. partilha de noites simples. mãos à procura da saudade. lugares cheios de futuro. o mundo à flor-da-pele. madrugadas abençoadas pelo mesmo céu. e estrelas a cairem-nos nas mãos.
durmo. e sonho sonhos feitos de vento. e voo no arco dos violinos. e sou teclas de piano e trompetes em noites inundadas de verão. invento volutas de música a encharcar o mundo. e subo em notas de estonteante maravilha. e desço. deslizando na alquimia dos sentidos. e componho-me devagar. ao som do meu desejo. como quem sabe que tudo é feito de céu.porque acredito que somos uma parte inteira do mundo. porque cada janela que abro me lança em escadas de eterno espanto. porque danço na paleta das cores da minha imaginação. porque simples é o mundo quando comungamos da mesma respiração. porque à tona das sensações, são felizes os dias que trago pela mão.abraçar os pássaros. guardar nuvens nos bolsos. adormecer o coração.o berço do mundo a embalar-nos as noites. ter estrelas nos olhos. e jurar que sempre estivemos aqui.
entornar alegria no mundo. sonhar muito alto. hastear navios de esperança. e mergulhar em golfadas de amor profundo.
escolher uma direcção outra. virar. sentir. olhar de novo. trocar de sítio. inventar esquinas. ruas. varandas. semáforos de eterno verde. cruzar-me. cruzar-te. rodar os relógios ao contrário. dançar o corpo. a alma. tocar. perder-me no avesso do mundo. seguir em espirais de caminho. seguindo em frente. rumo a quem sou.vou roubar-te do mundo
eu sonho-te e o mundo acontece
diz-me: esconde-te. eu encontrar-te-ei.

2 comentários:

  1. Olá Mozart!

    Pôxa que belas paisagens!muito familiares!A Juliana me escreveu sobre você,colocou seus endereços virtuais!Confesso que fiquei extasiada com esse texto aqui...
    Permita-me dizer que parece muito com alguns dos meus devaneios!
    Tem musicalidade,simplicidade,verdade!
    "Dorme mais um pouco"
    e Dormir apenas nos traz versos tão sonhados...

    visite meu jardim,fique a vontade
    um abraço forte na alma
    grande prazer lhe conhecer
    Flor(Adélia Coelho)

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  2. Há palavras q falam,palavras q embalam...
    esta vida pode ser um sonho ou a realidade dura dos q apenas olham,mas não vêem...
    Maravilhosa suas palavras embala-nos em sonhos e nos permite enxergar além.
    AMEI!!!!bjus carinhoso
    selena

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